Conheci alguém que no dia de seu aniversário de 43 anos ganhou o maior presente de sua vida: o despertamento e o início de sua cura.
Apesar de ser alguém aparentemente bem-sucedido na vida profissional e pessoal, vivia acorrentado a situações não resolvidas de seu passado e que somente com a maior dor já experimentada em sua vida, foi lançado no sofrimento e na escuridão do deserto para finalmente encontrar a luz.
Até então, tinha em seus traços de personalidade a ansiedade, o medo do abandono, o medo da rejeição, o medo da solidão, a impulsividade, a necessidade de aprovação, dificuldades em lidar com frustrações, desconfiança, ciúmes entre outras questões.
Por direção divina, foi levado a olhar para seu passado, para sua infância, para fatos que fez questão de esconder, de esquecer e que achava que tinham ficado para trás. Mas o passado nunca nos abandona e as coisas não resolvidas anseiam por serem curadas.
Em suas buscas em treinamentos, terapias e orações, foi levado às raízes de seus comportamentos.
Entendeu, por exemplo, como sua ansiedade foi gerada na sua infância (aos 8-9 anos de idade), quando estudava no período da tarde e seu pai demorava muito para buscá-lo, chegando à noite, quando os estudantes do noturno já estavam na escola.
Como seu sentimento de frustração surgiu quando participou de um “amigo oculto” (aos 6-7 anos de idade) na escola e, apesar de ter dado um excelente presente (uma linda boa de futebol), recebeu o pior presente da turma: um lápis, uma caneta e uma borracha. O importante, era participar, mas como criança não tinha maturidade para entender.
Certamente o mais surpreendente foi compreender que muito no início de sua gestação, havia mais um feto lá, um irmãozinho, mas que esse não sobreviveu e ali foi seu primeiro sentimento de abandono, solidão, rejeição e culpa por ter sobrevivido, então passou a vida tentando preencher o vazio com relacionamentos e coisas.
Descobriu que sua dificuldade de confiar surgiu quando (aos 6-7 anos de idade) foi enganado e traído por alguns colegas de sala que o induziram a praticar algo errado, um pequeno furto, para poder fazer parte da turma dos “descolados”, que depois foi descoberto, foi humilhado na escola e surrado em casa a ponto de ficar um ou dois dias sem ir para a escola por causa das marcas.
Compreendeu que seu ciúme surgiu quando, após a separação de seus pais, assumiu psicológica e inconscientemente a função de marido e protetor de sua mãe, mas a viu beijando outro homem, o que levou a uma severa discussão, agrediu fisicamente sua mãe, ouviu dela que “não o considerava mais seu filho” e então se fechou intimamente para ela e para os relacionamentos posteriores, com dificuldades para confiar plenamente.
Tudo isso teve que passar por um profundo processo de conscientização, aceitação e de acolhimento daquela criança que tanto sofreu, para que esses sentimentos não tivessem mais tamanha força a ponto de fazê-lo agir de modo que posteriormente se envergonhasse. Em sua condição humana, não deixará de ter esses sentimentos, mas não será controlado por eles.
Passou a entender que os traumas podem ter sido intencionais ou não, conscientes ou não, recordados por nós ou não, pois o que gera marcas é a forma como foram percebidos em nossos sentimentos. Ainda aprendeu que essas profundas marcas em nossa alma podem ser tanto da relação com seus pais, como com outras pessoas.
Entendeu como o destino une pessoas que possuem situações do passado que se entrelaçam e que ambas precisam resolver. Então, inconscientemente são levadas a oportunidades de cura, mesmo que mediante sofrimento e perdas. Aprendeu que essas perdas podem ser corrigidas e restauradas, mas que para isso os dois precisam querer, pois é impossível forçar o outro a olhar para dentro de si e encarar seus traumas. O despertar é individual e, infelizmente, aquele que prefere não buscar esse caminho, mais cedo ou mais tarde, passará novamente por outra janela de sofrimento onde a oportunidade se apresentará, pois a vida quer que sejamos curados.
Aceitou o fato de que tudo em sua vida aconteceu exatamente como precisava ter acontecido, no momento certo e da forma certa.
Aprendeu que não se trata de “perdoar” seus pais e seus ancestrais, porque, quando faz isso, se coloca em lugar de superioridade, afrontando a ordem natural da vida, uma vez que é filho. Compreendeu que o caminho é o da “aceitação” como parte do plano divino para cada um de nós. Pois, a aceitação é a única opção para ser refeita a conexão do amor, do perdão, da admiração, da paciência, da compaixão. É necessário deixar com eles o que é deles e agradecer a força que nos transmitiram ao nos presentear com a vida.